Defesa do réu e suas espécies

(imagem ilustrativa/ autor desconhecido)

O autor contém o direito de ação, que dentro de uma relação processual, é voltado contra o Estado, mas que detém o exercício de direito perante e contra aquele que é parte passiva, o réu, ou seja, a sentença formulada pelo Estado, respeitado na figura do juiz, conterá efeitos na esfera jurídica do réu, que necessita se defender de tal pretensão. Então, por tal vínculo construído, respeitando os princípios processuais, o réu fica assegurado por lei à participação de todos os atos e trâmites, para que possa defender-se perante o Estado, pois é o direito público subjetivo de se opor contra pretensão que autor deduz que é o que será respeitado.

Humberto Theodoro Júnior deixa explícito em sua obra que, a defesa deverá ser um direito exercido e assegurado para o réu, pois coloca que “Como há um direito abstrato de ação, há também um direito abstrato de defesa” [1]. O sistema processual brasileiro constitui-se com fundamento principal em princípios, que observam a definitiva forma de proteção e de resposta daquele que é citado para uma pretensão perante o poder Judiciário.

Ocorre que há varias formas de o réu ser citado, conforme estabelece o art. 246 do Novo Código de Processo Civil [2], que geram efeitos e posicionamentos próprios do réu dentro dessa relação. Observa-se que a ideia da citação, colocada no art. 238 do NCPC [3], estabelece que a citação seja o ato para integrar a relação, mas de forma automática a tal integralização e não apenas uma mera convocação para defesa, conforme coloca Daniel Amorim Assumpção Neves, 2016:

O art. 238 do Novo CPC prevê que a citação é o ato pelo qual se convoca o réu, o executado ou o interessado (o termo “demandado” seria mais adequado) para integrar a relação jurídica processual. Apesar de não estar integralmente correto, já que a citação não convoca o demandado a coisa alguma, integrando-o automaticamente à relação jurídica processual, o conceito é melhor que o anterior. [4]

Ressalta-se aqui que o juiz poderá designar audiência de conciliação e mediação, que será designada por ele mesmo no despacho que verifica a exordial observando os seus requisitos essenciais, e, claro, se não for o caso de improcedência liminar do pedido. Será observado o prazo de até 30 (trinta) dias de antecedência, onde o réu será citado com pelo menos 20 (vinte) dias de antecipação e o autor será intimado na figura do seu advogado (art. 334, caput e § 3º, do Novo Código de Processo Civil [5]). A audiência será presidida por um mediador ou conciliador, onde há os auxiliares corretos para dar apoio à justiça.

Poderá não ocorrer essa espécie de audiência, somente quando houver manifesto desinteresse pelas partes na composição conciliatória e quando o objeto do litígio não admitir a autocomposição (art. 334, § 4º do Novo CPC). O comparecimento das partes será acompanhado de um advogado particular ou defensor público (art. 334, § 9º). Caso ocorra a conciliação, essa será reduzida a termo, que será homologado pelo juiz por sentença que extinguirá o processo, julgando o seu mérito. .

Em seu livro, Luiz Guilherme Marinoni, ressalta a tendência do Novo Código de Processo Civil:

Uma das novidades em termos procedimentais do Novo Código está na previsão de uma audiência de conciliação ou de mediação antes da apresentação da defesa pelo demandado. Trata-se de previsão que visa a estimular a solução consensual dos litígios, concedendo à autonomia privada um espaço de maior destaque no procedimento. Além disso, constitui manifestação de uma tendência mundial de abrir o procedimento comum para os meios alternativos de solução de disputas, tornando a solução judicial uma espécie de ultima ratio para composição dos litígios.[6]

Ainda, neste mesmo sentido, Humberto Theodoro Júnior reforça a importância dessa espécie de audiência implementada pelo Código de 2015:

A importância da audiência de conciliação ou de mediação não se limita à possibilidade de autocomposição, mas, também, se explica pela facilitação do contato direto do juiz com as partes, permitindo, no início do processo, o diálogo a respeito do litígio e das provas que serão necessárias para a demonstração dos fatos, com o que se prestigia o princípio da cooperação. Nessa oportunidade, o juiz deverá esclarecer às partes sobre o ônus da prova, fixar os pontos controvertidos, delimitar as questões de direito relevantes para o julgamento do mérito e as de fato, sobre as quais recairá atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos. Com isso, evitar-se-á dilação probatória desnecessária e, por conseguinte, estimulará a celeridade da prestação jurisdicional. Esse diálogo do juiz com as partes apressa “o encerramento da fase cognitiva com uma maior segurança, que resultará na entrega da tutela jurisdicional, mais eficaz e célere, sem deixar de respeitar os princípios basilares do contraditório, ampla defesa.[7]

Diante da sua inclusão processual por meio da citação, da ciência da propositura da ação e da tentativa de autocomposição por parte de ambos os polos, o réu poderá adotar atitudes diferentes através de suas defesas, que para alguns autores, como Fredie Didier Júnior [8], Humberto Theodoro Júnior [9], Marcus Vinicius Rios Gonçalves [10] e Cândido Rangel Dinamarco [11], as defesas poderão se dividir em: a) processuais e mérito; b) direta e indireta; c) dilatória e peremptória; e ainda d) exceção e objeção.

Basicamente, as defesas do réu, se dividem em defesas processuais e de mérito, que são definidas como:

a) As defesas processuais são aquelas que antecedem as defesas de mérito e que tem por objeto requisitos de admissibilidade da causa, abrangendo questões meramente processuais, com previsão de rol exemplificativo no art. 337 do Novo Código de Processo Civil, subdivididas em defesas:

  1. Dilatórias: são aquelas que pretendem postergar o julgamento da causa, pois apontam vícios sanáveis que são corrigidos pelo autor, cuja omissão gera extinção do processo, não acarretando a apreciação do mérito (por exemplo, as hipóteses do art. 337, incisos I, II, III, VIII, IX do NCPC);
  2. Peremptórias: são aquelas que por si só objetivam a extinção do processo sem a apreciação do pedido do autor (por exemplo, as hipóteses do art. 337, incisos IV, V, VI, VII, X do NCPC);


b) As defesas de mérito são aquelas que impugnam o pedido apresentado na Petição Inicial. Humberto Theodoro Júnior acrescenta que as defesas de mérito também podem ser dilatórias ou peremptórias, visando à exclusão do direito material ou procrastinação de mero exercício do direito, exemplificando como defesas dilatórias de mérito, as que se fundam no direito de retenção por benfeitorias ou na exceção de contrato não cumprido [12]. Em regra, são subdivididas em:

  1. Diretas, que são configuradas como as defesas que negam os fatos constitutivos de Direito alegados pelo autor, não acrescentando fato novo ao processo, observa-se que aqui só se pode falar em defesa de mérito direta, pois todas as defesas processuais consideram-se indiretas. Aqui, não se inverte o ônus da prova;
  2. Indiretas, que são as defesas que reconhecem os fatos constitutivos de Direito, mas que acabam acrescentando outros que são impeditivos, modificativos ou extintivos de Direito. Aqui, se inverte o ônus da prova, sendo agora do réu, em relação aos novos fatos arguidos (art. 373, inciso II, do NCPC [13])


As defesas terão como base o princípio da impugnação específica, que indica que todos os fatos alegados pelo autor devem ser impugnados pelo réu, na qual, os fatos não impugnados devem ser considerados verdadeiros, excetuando os casos do defensor público, advogado dativo e o curador especial (art. 341, e parágrafo único do NCPC [14]); e ainda, o princípio da eventualidade, onde ressalva que, o momento processual oportuno para alegar todos os fatos e oferecer a defesa de forma congruente, é a peça da Contestação.

É possível observar dentro dessas formas de defesas, que há conceitos para o termo “exceção”. A palavra exceção poderá ser conhecida em dois sentidos, conforme coloca Marcus Vinicius Rios Gonçalves [15]: exceção em sentido amplo e exceção em sentido estrito.

A exceção em sentido amplo, basicamente, constitui-se em algo abrangente, ou seja, o direito de se contrapor ao pedido formulado na inicial, que visa neutralizar a pretensão do autor. Renato Montans de Sá indica que as exceções, neste sentido, quando utilizadas com argumentos de direito material, como, por exemplo, o direito de retenção de benfeitorias (art. 1.219, CC), classifica-se como exceção substancial; já nos casos de utilização de argumentos processuais, como, por exemplo, a arguição de incompetência relativa (art. 337, II, NCPC), denomina-se como exceção processual [16].

Todavia, a exceção em sentido estrito, é a contraposição do termo “objeção”. As defesas do réu poderão ser de ordem pública, cujo interesse é de todos, não só do réu, e logicamente as que não são de ordem pública. Desta forma, as primeiras que foram mencionadas, as defesas de ordem pública, ainda que não alegadas pelo réu, poderão vir a serem conhecidas "ex officio" [17], ou seja, não precluem [18], mesmo que não sejam arguidas pelo polo passivo na primeira oportunidade, então, são denominadas de objeções. 

Para Marcus Vinicius Rios Gonçalves, as objeções poderão ser processuais, que é o exemplo da arguição da falta de condições da ação, e serão materiais ou substanciais, que é o caso da decadência [19]. Há ainda aquelas defesas que não são de ordem pública, pois são estritamente do interesse do réu, ou seja, devem ser alegadas pelo polo passivo da relação, não podendo, neste caso, ocorrer o conhecimento de ofício por parte do juiz. Importa aqui ressaltar, que essas exceções precluem, caso não alegadas pelo réu. Observa-se que, as exceções aqui mencionadas são em sentido estrito, podendo virem a serem de cunho processual, que é o caso da incompetência relativa, ou material, como o pagamento [20].

É bom registrar aqui a questão relativa à prescrição [21], que para Marcus Vinicius Rios Gonçalves poderá ser uma questão prática de objeção, pois ela poderá ser arguida até em fase de apelação, embora tenha que dar direito das partes se manifestarem, conforme coloca em seu livro:

Hoje, diante do que consta do art. 487, parágrafo único, do CPC, e da possibilidade de alegar-se a prescrição até mesmo em fase de apelação, não pode haver mais dúvida de que ela foi incluída entre as objeções, embora, antes de reconhecê-la, o juiz tenha que dar às partes oportunidade de manifestar-se. [22]​

Conclui-se que a Defesa da Réu é um tema amplo com várias nuances e especificações, que devem ser observadas para que não ocorra nenhum erro dentro de relação processual estabelecida entre autor, Estado-juiz e réu. Destaca-se que o texto propôs uma separação das defesas em processuais e de mérito, que consequentemente foram subdivididas, as primeiras em dilatórias e peremptórias, e as últimas em diretas e indiretas; além da explicação do uso do termo “exceção”, que atualmente, trata-se de algo muito mais amplo do que o usual.


Autor: Dr. Mateus Feitosa & Dr. Luís Henrique Antonio


Bibliografia:


[1]THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume 1. 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p.179.

[2]CPC/73, art. 221.

[3]CPC/73, art. 213.

[4]NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Volume único. 8ª ed., Salvador: Editora JusPODIVM, 2016, p. 1018.

[5]CPC/73, art. 331.

[6]MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDEIRO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil. Volume 2, tutela dos direitos mediante procedimento comum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 173.

[7]THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume 1. 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 781.

[8]DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Volume 1, introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 17ª ed., Salvador: editora JusPodivm, 2015, p. 632.

[9]THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume 1. 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 787.

[10]GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. Volume único. 6ª ed., São Paulo: editora Saraiva, 2016, p. 383.

[11]DINAMARCO, Cândido Rangel. LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Teoria Geral do Novo Processo Civil. Volume único. São Paulo: Malheiros Editores, 2016, p. 121.

[12]THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume 1. 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 786.

[13]CPC/73, art. 333, inciso II.

[14]CPC/73, Art. 302.

[15]GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. Volume único. 6ª ed., São Paulo: editora Saraiva, 2016, p. 388.

[16]SÁ, Renato Montans de. Manual de Direito Processual Civil. Volume único. 2ª ed., São Paulo: editora Saraiva, 2016, p. 368.

[17]Ex officio: equivale a expressão “conhecimento de ofício pelo juiz”.

[18]“Preclusão, nesse caso, vem a ser a perda da faculdade ou direito processual, que se extinguiu por não exercício em tempo útil. Recebe esse evento a denominação técnica de preclusão temporal. Mas há, em doutrina, outras espécies de preclusão, como a consumativa e lógica, todas elas ligadas à perda de capacidade processual para a prática ou renovação de determinado ato” (THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume 1. 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 523). Trata-se de matéria de Direito processual.

[19]“Segundo Francisco Amaral, decadência é a perda do direito potestativo pela inércia do seu titular no período determinado em lei. Seu objeto são os direitos potestativos de qualquer espécie, disponíveis ou indisponíveis, direitos que conferem ao respectivo titular o poder de influir ou determinar mudanças na esfera jurídica de outrem, por ato unilateral, sem que haja dever correspondente, apenas uma sujeição” (Direito civil: introdução, p. 561 apud Gonçalves, 2013, p. 421). Trata-se de matéria de Direito material.

[20]GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. Volume único. 6ª ed., São Paulo: editora Saraiva, 2016, p. 390.

[21]“Segundo Pontes de Miranda, a prescrição seria uma exceção que alguém tem contra o que não exerceu, durante um lapso de tempo fixado em norma, sua pretensão ou ação” (Tratado de direito privado, v. 6, p. 100 apud Gonçalves, 2013, p. 406). Trata-se de matéria de Direito material.

[22]GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. Volume único. 6ª ed., São Paulo: editora Saraiva, 2016, p. 390.

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